Não considero minha avó como
uma pessoa sábia ou com grande capacidade intelectual. Ela nunca me deu
conselhos, nunca me deu presentes, e nos últimos anos nem gostava muito de
conversar. Desde que tenho minhas primeiras memórias, a única coisa que eu
sabia que minha avó gostava de fazer era de se
movimentar: fazer pão, caminhar, cortar lenha, correr atrás do meu irmão.
Mas foi justamente por toda
essa energia, que ela me ensinou
duas emoções e movimentos valiosos: o cuidado
e a paciência.
Primeiro, porque desde
criança foi ela quem cuidou de mim, que me alimentou, vestiu, e se preocupou
comigo enquanto meus pais trabalhavam. Depois, porque o Alzheimer fez com que
ela voltasse a ser criança, e então fui eu quem precisou cuidar, alimentar, e
se preocupar com ela enquanto meus pais trabalhavam. Com ela eu aprendi a
desempenhar dois papeis: a criança cuidada, e o adulto cuidador.
Nos últimos anos, com a
demência, nos aproximamos mais do que em qualquer outra fase. E foi então que
eu percebi o quanto minha avó era uma mulher fantástica, energética, e com um
coração gigante. Todos os dias ela se deliciava com abraços, mexia as mãos como
se tentasse dançar, e gargalhava tão alto que suas risadas enchiam a casa toda.
Os gatos dormiam com ela todas as tardes; as senhoras da igreja vinham
visita-la sempre que possível; e nos poucos lugares que ela ainda frequentava,
todas as pessoas elogiavam o quanto ela era carinhosa: cumprimentava a todos,
abençoava, cantava e fazia orações.
Ela não sofreu. Ela viveu
sorrindo, rezando, e cuidando de nós; e, ao fechar os olhos pela última vez,
ela o fez tranquila, rezando, e sendo cuidada por aqueles a quem ela sempre deu
amor. Ela nunca esteve sozinha. Viveu cercada de amor e é assim que ela se foi,
depois de 95 anos de vida, de cuidado e de paciência.
Não fiquei muito tempo do
velório, não me aproximei do caixão. Quando recebi a notícia e fui para casa, a
primeira coisa que fiz foi tomar café – porque eu sabia que, se ela estivesse
desperta, ela perguntaria se eu estava com fome e me mandaria comer. As coisas
que eu aprendi com ela, como comer nas horas certas e tentar sempre ter uma
companhia à mesa, eu nunca vou esquecer. Ontem, não me despedi. Minha despedida
foi cara-a-cara, há dois dias, quando ela começou a enfraquecer e balbuciou que
precisava ir embora. Eu disse que a amava, mas que já estava na hora de ela nos
deixar – e nós ficaríamos bem.
Por isso, se aí do céu a
senhora puder ler isso, saiba que eu estou bem. Saiba que todos estão tristes,
que a mãe vai levar muito tempo para superar, mas que todos ficarão bem. Do
jeitinho que a senhora ensinou.
Te amo, vó. Obrigada por
todas as experiências que a senhora me permitiu viver, e obrigada por ter sido
uma companhia tão alegre.